Escolha
ESCOLHAS
Pensem numa escolha que podem
vir a ter que enfrentar. Provavelmente, a escolha em que pensaram foi
uma coisa grande, uma coisa importante, uma coisa que o preocupa. Estas
escolhas são ocasiões de agonia, de desespero, de ranger de
dentes. Penso que interpretamos mal as escolhas e o papel que elas desempenham
na nossa vida. Compreender as escolhas revela um poder oculto que
todos nós possuímos.
O que torna a escolha uma
ocasião incomoda é a forma como as alternativas que se apresentam, se
relacionam. Parece que nenhuma das alternativas seja melhor do que a outra; e
isso nos enche de angústia. Há vantagens até na omissão de escolha; e não há
uma unanimidade. Um caso simples de escolha: devo no café da manhã comer
algo saudável ou saboroso? Cereais ou um donut de chocolate?
Não saber o que escolher,
mostra que somos estúpidos?
Quando terminei o ensino
médio, não conseguia decidir-me entre cursar a faculdade ou ir pro mercado
de trabalho. Eu amava estudar, mas as condições financeiras familiares
eram desanimadoras. Por uma lado há coisas espantosas que
aprendemos enquanto acadêmico, no conforto de um livro, no ambiente
intelectualizado de uma universidade.
Mas eu pertencia a uma miserável
família, quase todos de analfabetos funcionais. Minha ideia de luxo era ter um pedaço de
restos de carne retirada do osso, e um pão velho surrupiado da despensa da
padaria do bairro. Por isso, a ideia de passar toda uma vida sentado
numa escrivaninha, a estudar e produzir teses; chocava-me. Soava como o
cúmulo da extravagância e da inutilidade. Daí a escolha da opção mais
segura na época.
O medo de ser um filósofo ou
escritor desempregado levou-me a ser militar. E, como vim a descobrir, a
vida militar não me convinha. Não era quem eu era, e por si mesma
transformou-se no voo de galinha.
Por isso, agora estudo as
escolhas. Posso lhe dizer que o medo do desconhecido, embora seja um
padrão de motivação vulgar que influi nas escolhas, baseia-se na má
interpretação delas. Não há nas alternativas de escolha, uma decisão que
seja realmente melhor; seguir pelo caminho daquela de menor risco, e não
necessariamente a melhor, pode ser enganoso, porque não há uma escolha “melhor”.
Ora, se todas são igualmente
boas, basta somente jogar uma moeda ao alto?
Não. Embora não haja uma
melhor em sentido absoluto, elas não são igualmente boas ou ruins.
Então como é que podemos
escolher?
Simples; saber qual das
alternativas revela alguma coisa sobre si mesmo; exercitar o nosso poder
normativo, o poder de criar razões para nós mesmos, de nos tornarmos
no tipo de pessoas por detrás de uma das opções e dizer: é aqui que eu me
situo. É aqui que eu “sou eu”.
É uma escolha sustentada por
razões que nós criamos para assim nos tornar, incondicionalmente, na pessoa que
somos. Pode se dizer que passamos a ser os autores da nossa vida. Por
isso, quando enfrentamos escolhas, não devemos bater com a cabeça contra a
parede tentando imaginar qual é a melhor alternativa. A melhor
alternativa não existe.
Em vez de olhar para as razões
exteriores, devemos procurar ver as razões dentro de nós mesmo: quem
é que eu vou ser? Porque se não o fizer ficará à deriva.
Todos conhecemos pessoas que
andam à margem do que realmente são. Eu encaminhei-me para ser militar; mas
desembarquei logo em seguida. Não coloquei nesta escolha a minha ação e
nem me vi por detrás da vida em caserna. Deixei – por medo, que os
mecanismos de recompensa e de punição determinassem – à época, o que eu
deveria fazer.
Longe de ser uma fonte de
angústia e terror, as escolhas são oportunidades preciosas de
festejarmos o que é especial na condição humana. As razões que
governam as nossas escolhas, quer corretas, quer incorretas, por
vezes deixam de ter sentido. É aqui, no espaço das escolhas, que
temos o poder de criar razões para nós mesmos, de nos tornarmos nas pessoas
distintas que somos. É por isso que as escolhas não são uma
maldição mas uma bênção.
Escolha! A verdade será
revelada nela. E somente o tempo dirá.
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