Na boléia, o Brasil caminhoneiro!
Na boléia, o "herói"!
“Adeus, lembranças, abacaxi, livro, pedra, borracha, e o
que vier para onde o meu bom Deus me levar” assim é ser caminhoneiro. “Mazelas,
mínguas, abundancia, barrancos, buracos, asfalto, cidades, vilarejos, cachorro,
mendigos, padres” miragens que aparecem e viram fumaça em suas mentes.
Trilhando rotas, assediando sonhos em condições de labor que revelam
hostilidades, enfrentamento, restrição, contenção. Cada novo dia e a cada
respirar uma guerra contra ditames burocráticos e incertezas de estar ainda
vivo ao anoitecer deste mesmo dia. Períodos de doída solidão, ausência de
amados, limites nas práticas de convivência. Um ser humano fragmentado em
muitas semelhanças e divergências onde uma dinamicidade e distanciamento de
aproximações, identifica o caminhoneiro que interpreta a si numa realidade
muito própria e singular. O passado caminha a cavalheiro do presente em laços
de personalidades muito distintas. A sociedade pouco desvela deste ser ativo
que se mostra na mídia somente a partir de ações de criminosos. Agora, em
crise, este ser “oculto”, se faz presença, e a sociedade tomada de assalto,
reconhece suas legalidades. O então herói das estradas da década de 60 a 80,
protesta; e se torna o vilão no olhar das “autoridades”.
A estrada e seu asfalto negro é todo o seu porvir numa
ilusória vida de peripécias e alegria prazerosa. Ali, na boléia do caminhão, é
todo desbravador. Em meio ao abandono de uma vocação ferroviária, estas “autoridades”
optam por um país rodoviário que agora é refém por andar, viver e crescer sobre
as rodas. Este “herói” anônimo que se perde nos grandes atoleiros do descaso
público está sendo enganado desde sempre. Se abraça no ex-Adocymos, o “caminhoneiro”
do menino Deus, seu poderoso “São Cristóvão”. Nas transportadoras é tratado
como um cão raivoso, pelo governo com descaso e pela mídia, com esquecimento.
Estão ao acaso carregando literalmente todo o peso e a riqueza de um país. Hoje
deixa a todos de joelhos. O troco está sendo dado pelo herói-vilão? Caso exista
uma fila, creio que estejam muito lá atrás. O profissional “herói campeão e imprescindível”
de antes deu lugar no seu imaginário de uma grande desilusão, o que o faz
questionar das escolhas. Pura paixão.
Arrependido da escolha de ser caminhoneiro, agora encara e enfrenta
as dificuldades e privações. Enganados que foram por discursos de autoridades e
matérias jornalísticas que os fizeram acreditar nesta escolha que mesclado para
as condições aventureiras os conduziram neste caminho. Mais um dos enganados
pelo completo descaso dos poderes. A visão poética dos anos 90 do caminhoneiro religioso
e responsável, reivindicador até, que se orgulha da profissão enfrenta a imagem
hoje que desfila pela tv: indignação, descaso, desrespeito, humilhação e
exploração como lugar de destaque. Um herói sem vitorias que opera num extremo
de tolerância da desesperança. Já não mais há prazer em viajar. Conhecer o Brasil
de ponta-a-ponta é um risco.
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